Os Cinco Poderes do Coração

As dezoito seções do Mahābhārata apresentam um tratamento enciclopédico acerca do conhecimento humano, a partir, unicamente, da interação da natureza imperfeita e finita dos seres vivos com a natureza sagrada, perfeita e infinita, que envolve todo o universo. Considerado a quintessência dos Vedas, ou o quinto Veda, o Mahābhārata trata deste grande tema a partir dos Cinco Poderes do Coração, ou Cinco Puruṣārthas, a saber:

1. Dharma, o sentimento de sagrado, que nos faz aspirar pela proteção de todas as formas de vida e preservação de seu ambiente;
2. Artha, a capacidade de prosperar até se alcançar o poder de ser livre;
3. Kāma, o desejo de felicidade;
4. Mokṣa, a capacidade de compreensão plena da ciência do sagrado e do profano (Yoga-Brahma-Vidyā); e
5. Prāpti, a convergência para Brahman.

O quinto Puruṣārtha, mais conhecido como Brahma-Prāpti, surge no segundo capítulo da Gītā e é aprofundado no capítulo décimo-quinto, intitulado Puruṣottama Prāpti Yoga, ou a via de realização do Ser Supremo, simbolizada no quadro da Gītopadeśa (ensinamento da Gītā). A quadriga representa o corpo e os corcéis brancos correspondem à quádrupla organização dos sentidos em torno das faculdades de cognição, vontade, ação e síntese. As rédeas simbolizam a mente inferior em sua relação com os quatro referidos aspectos dos sentidos. Arjuna representa o discípulo ainda preso ao processo do mundo, mas aspirando à suprema meta humana, a Brahma-Prāpti. Śrī Kṛṣṇa, o quadrigueiro, representa a consciência pura que, brilhando sob a égide da equanimidade do coração, controla as rédeas, a mente inferior, cuja jurisdição são os sentidos (os corcéis), para que esta, livre das obstruções da multiplicidade, os possa dirigir pelo caminho eterno e sem faltas, que conduz à meta.

Há ao longo da Gītā várias expressões relativas à natureza da Brahma-prāpti, com conotações aparentemente contraditórias, mas que são, em verdade, explanatórias dos outros quatro poderes nela subsumidos. Dentre elas, estariam as seguintes: Paraṃ (Ser Supremo); Parā-gati (Caminho Supremo); Parā-śānti (Paz Suprema); ātyantikaṃ sukhaṃ (felicidade infinita); Brahma-saṃsparśaṃ (contato, ou realização em Brahman); Brahma-nirvāṇam (dissolução, ou imersão em Brahman); Śānti-nirvāṇa-paramā (suprema dissolução na paz); kaivalyaṃ (liberação da matéria); samādhi (estado de profundo êxtase místico); sukhaṃ akṣayaṃ (felicidade infinita); e anāmayaṃ padaṃ (condição de Śiva, ou estado de absoluto vigor e saúde).

A versão da Gītā extraída do magistral Comentário de Haṃsa Yogi, que apresenta os versos reordenados tematicamente em vinte e seis capítulos, também deixa claro que o objeto principal do texto é a Brahma-Prāpti, a realização de Brahman.  Haṃsa Yogi explica em seu Comentário que as faculdades de que dispomos para alcançar a Brahma-Prāpti são quatro: (1) faculdade dos sentidos (indriyāni); (2) faculdade da mente emocional (manas); (3) faculdade cognitiva (buddhī ou jñāna), e (4) faculdade sintética (yoga). A convergência para a Brahma-prāpti dar-se-ia em termos de: (1) conhecimento (jñāna), (2) desejo (icchā) e (3) ação (karma), os quais se expressam, (4) em síntese (yoga), como o ATO (kriyā). Quatro expressões verbais designam a sequência natural do nosso funcionamento – (1) jānāti (ele/ela sabe); (2) icchati (ele/ela deseja/anseia); (3) yatate (ele/ela se esforça); e (4) prāpnoti (ele/ela materializa). Cada um desses tópicos é tratado separadamente nos quatro grupos de seis capítulos (Ṣaṭka) da Gītā de Haṃsa Yogi, a saber: Jñāna Ṣaṭka, Bhakti Ṣaṭka, Karma Ṣaṭka, e Yoga Ṣaṭka.


Os Cinco Poderes e a Universidade do Coração

 Os cinco poderes do coração representam as qualidades essenciais a serem desenvolvidas na futura Universidade do Coração. Tocamos as pessoas quando estimulamos nelas, por meio da energia do amor, os distintos aspectos desses poderes que já experimentamos em nós mesmos. “Onde está o teu coração aí está o teu tesouro” – afirmam as Escrituras, referindo-se a esta chave para a modificação de velhos hábitos e comportamentos a partir do processo gestação de novos conceitos.

Esta mensagem de esperança do divino discurso da Gītā está em consonância com os ideais da Universidade do Coração, que pretende estar isenta dos tentáculos das ideologias sectárias para poder se constituir em lenitivo para aqueles que estão na busca verdadeira. De acordo com a Gītā, os vícios e a transgressão moral são de natureza passageira e não impedem de forma definitiva a mais alta realização. O tempo para alcançar esta realização, entretanto, é função da nossa capacidade de realizar os quatro Puruṣārthas preliminares, ou Poderes do Coração, únicos capazes de nos conduzirem à Brahma-Prāpti, uma herança universal, a qual todos, sem exceção, no devido tempo, estão destinados a alcançar.

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